Devemos nos opor à pesca com arrastões, mas não à pesca local ou esportiva?

Devemos nos opor à pesca com arrastões, mas não à pesca local ou esportiva?

21 Jan 2015
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O governo australiano anunciou que a partir de março de 2015 baniria permanentemente os enormes barcos de pesca chamados arrastões. Esses navios, com mais de 130 metros de comprimento, podem matar um gigantesco número de peixes por dia. Eles trabalham carregando redes de pesca de até 300 metros de comprimento, prendendo todos os peixes no caminho da rede.

A proibição da pesca com arrastões foi anunciada depois que uma petição contra eles recebeu quase 63.000 assinaturas1. Apoiadores da petição expressaram a preocupação de que os arrastões fossem uma ameaça à vida marinha, à pesca comercial, à pesca esportiva e ao turismo. Também mencionaram que, além das vítimas pretendidas, as redes capturavam um grande número de peixes e mamíferos marinhos ameaçados de extinção.

Depois de ouvir as queixas das partes afetadas, o secretário parlamentar da agricultura emitiu um comunicado dizendo: “O governo está determinado a garantir que a gestão pesqueira australiana permaneça entre as melhores do mundo”. Esta declaração deixa claro que a mudança na política não visa proteger os animais marinhos ou acabar com a prática de matá-los para fins esportivos ou comerciais, mas apenas para modificar os métodos de pesca permitidos.

Uma das principais objeções dos apoiadores da petição é que os arrastões contribuem para o esgotamento global dos peixes. Os peticionários querem deter os arrastões para garantir a viabilidade das práticas de pesca em águas australianas.

Outra de suas principais preocupações é que a pesca de arrasto mata muitos animais que não são o alvo dos pescadores. Incluem outros peixes, outros vertebrados como aves marinhas, tartarugas e golfinhos e também um número muito grande de invertebrados. Como os pescadores não podem vender esses animais, eles são jogados fora2.

fishing-with-supertrawlersIsso acontece em grande escala particularmente no caso da pesca de arrasto, mas também ocorre com outros métodos de pesca. Os anzóis de pesca com espinhel, por exemplo, matam muitas aves marinhas que ficam presas neles porque querem comer a isca.

Se considerarmos os interesses dos animais afetados, como os interesses em não sofrer e em continuar vivendo, devemos nos opor a todas as formas de pesca. Não são apenas os arrastões que são o problema, mas também os barcos de pesca comercial, local e esportiva, pois todos eles causam a morte de animais sencientes3.

Devemos notar também que, embora a pesca industrial mate um número imenso de animais4, a pesca esportiva também mata um número muito significativo5. De fato, de todas as formas pelas quais os animais não humanos são prejudicados para entretenimento, a pesca esportiva é de longe aquela em que mais animais são feridos e mortos. Os números geralmente são contados não em termos de indivíduos, mas de seu peso. No entanto, as cifras do peso são tão altas que podemos estimar que muitos bilhões de animais morrem devido à pesca esportiva todos os anos6.

O problema com a pesca é que ela mata e prejudica os animais sencientes. Quando um animal é vítima de pesca, seus interesses mais importantes são desconsiderados. Não faz diferença se o peixe é privado da vida por um barco de arrastão ou por um pequeno barco de pesca local. Além disso, a morte de um peixe não se torna melhor ou pior dependendo de se pertence ou não a uma espécie ameaçada.

Desconsiderar animais não humanos sencientes em favor dos animais humanos é especismo.


Notas

1 Medhora, S. (2014) “Supertrawlers to be banned permanently from Australian waters”, The Guardian, 24 December [acessado em 7 de janeiro de 2015].

2 Alverson D. L.; Freeberg, M. K.; Murawski, S. A. & Pope, J. G. (1994) A global assessment of fisheries bycatch and discards, Rome: Food and Agriculture Organization of the United Nations.

2 Sneddon, L. U. (2003) “The evidence for pain in fish: The use of morphine as an analgesic”, Applied Animal Behaviour Science, 83 (2), pp. 153-162. Braithwaite, V. (2004) Do fish feel pain?, Oxford: Oxford University Press. Chandroo, I. J. H. & Moccia, R. D. (2004) “Can fish suffer?: Perspectives on sentience, pain, fear and stress”, Applied Animal Behaviour Science, 86, pp. 225-250.

4 Mood, A. (2010) “Worse things happen at sea: The welfare of wild-caught fish”, Fishcount.org.uk [acessado em 18 de outubro de 2010]. Mood, A. & Brooke, P. (2010) “Estimating the number of fish caught in global fishing each year”, Fishcount.org.uk, July [acessado em 18 de outubro de 2010].

5 Balon, E. K. (2000) “Defending fishes against recreational fishing: An old problem to be solved in the new millennium”, Environmental Biology of Fishes, 57, pp. 1-8.

6 Cooke, S. J. & Cowx, I. G. (2004) “The role of recreational fisheries in global fish crises”, BioScience, 54, pp. 857-859.