A Declaração de Nova York sobre a Consciência Animal, recentemente assinada por um grupo de cientistas e filósofos eminentes, marca um reconhecimento importante da crescente evidência científica de que uma vasta gama de animais, incluindo todos os vertebrados e muitos invertebrados, são provavelmente conscientes e capazes de experimentar subjetivamente o mundo.
A declaração destaca que existem fortes evidências científicas de que mamíferos e aves são conscientes, e que há uma “possibilidade realista” de consciência em outros vertebrados como répteis, anfíbios e peixes, bem como em muitos invertebrados, incluindo polvos, caranguejos, camarões e insetos. Estudos recentes revelaram que:
– Polvos evitam a dor e procuram alívio da dor, sugerindo que têm experiências subjetivas.
– Chocos conseguem lembrar detalhes de eventos passados específicos, indicando que possuem algo similar à memória episódica.
– Abelhas apresentam comportamentos que podem ser consistentemente interpretados como brincadeiras, o que é um sinal de possuem estados emocionais positivos.
– As cobras-liga (cobras do gênero Thamnophis) reconhecem seu próprio cheiro, indicando que possuem autoconsciência.
– As moscas-das-frutas têm padrões de sono ativos e tranquilos que são perturbados pelo isolamento social, similarmente ao que acontece com as experiências de humanos em tais condições.
Comportamentos como aprendizagem, planejamento, resolução de problemas e autoconsciência fornecem evidências convincentes de que as mentes dos invertebrados são mais complexas do que normalmente se supõe. Entretanto, é importante lembrar que sofisticação cognitiva não é necessária para a consciência. Porém, sua presença é uma forte evidência de consciência porque, até onde sabemos, tal sofisticação requer consciência para que possa ocorrer.
Essas descobertas destacam que a capacidade de sofrer e de experimentar o bem-estar provavelmente está amplamente difundida em todo o reino animal. Tal como argumentamos nos nossos textos sobre imparcialidade e sobre a relevância moral da senciência, a experiência subjetiva — e não o pertencimento a uma espécie ou configurações específicas do sistema nervoso — é o que importa para a consideração moral.
A declaração destaca três pontos-chave: 1) Há evidências científicas sólidas que dão suporte à afirmação de que os mamíferos e as aves são conscientes. 2) Existe uma possibilidade realista de que todos os vertebrados e muitos invertebrados sejam conscientes. 3) Sempre que houver uma possibilidade realista de que um ser tenha consciência, temos uma obrigação ética de considerar os riscos ao bem-estar deste e os interesses desses animais enquanto indivíduos.
Esse terceiro ponto é crucial. A certeza absoluta sobre a consciência, mesmo em humanos, não é atualmente possível. Mas uma possibilidade realista de senciência é suficiente para justificar uma consideração moral séria. As nossas atitudes especistas atuais, que menosprezam as experiências dos animais e os tratam como meros recursos, são eticamente injustificáveis. Uma abordagem antiespecista, baseada no respeito pela senciência, significa dar consideração moral a todos os seres que podem ser capazes de sofrer e de sentir bem-estar, independentemente da sua espécie, de onde vivem ou de quando vivem.
A inclusão de invertebrados na declaração é particularmente digna de nota, uma vez que são frequentemente negligenciados nas considerações sobre bem-estar animal, apesar de constituírem a grande maioria dos animais do planeta. A maioria dos animais explorados pelos humanos são invertebrados como crustáceos e insetos – centenas de bilhões por ano – e os defensores dos animais raramente os mencionam. Um número ainda maior desses animais vive na natureza, onde enfrentam situações extremas como doenças, fome, parasitismo e predação. Uma ética antiespecista implica que devemos ajudá-los sempre que pudermos, independentemente de se a fonte de seu sofrimento são práticas humanas ou processos naturais.
Este pode ser um desafio imenso dada a escala do problema, mas não temos que resolver todo o problema para produzir um grande impacto. Já foram feitos progressos por meio do processamento de enormes quantidades de dados coletados por uma combinação de tecnologias, como câmaras, microfones, luz e imagens térmicas. À medida que continuamos a apoiar a investigação para compreender e melhorar o bem-estar dos animais na natureza, podemos também evitar contribuir com os prejuízos que os animais sofrem em decorrência da sua exploração ou como efeito colateral das nossas atividades.
Devemos também considerar a importância do futuro. Por exemplo, se os humanos algum dia virem a colonizar outros planetas, poderão levar junto, impensadamente, pequenos invertebrados, como insetos, para servirem como fonte de alimento ou para formarem parte do ecossistema. Temos a obrigação de considerar o seu bem-estar nestes cenários futuros e e evitar trazer animais à existência apenas para sofrer.
Além disso, se algum dia desenvolvermos inteligências artificiais que sejam conscientes, muitos dos mesmos princípios antiespecistas se aplicariam. A consciência é o que importa, não a espécie, o tamanho ou o substrato. À medida que a inteligência artificial e a biotecnologia avançarem, é possível que sejam criados tipos inteiramente novos de entidades sencientes. Temos a obrigação de considerar os riscos disso e de dar consideração às experiências desses potenciais seres sencientes.
A Declaração de Nova York enfatiza que não é necessária certeza absoluta sobre a consciência para darmos consideração moral aos animais. Existem fortes razões para pensar que muitos invertebrados são conscientes, e uma possibilidade realista de senciência cria uma obrigação de evitar prejudicá-los. O fato de a declaração reconhecer que a senciência em invertebrados é uma possibilidade realista cria uma necessidade urgente de realizarmos mais estudos a fim de compreender o que poderia prejudicá-los ou beneficiá-los. Esta pesquisa é fundamental para embasar políticas baseadas em evidências que protejam o bem-estar desses animais. Pesquisas são fundamentais para informar políticas baseadas em evidências para proteger o bem-estar deles.
Embora a declaração seja um marco importante, a defesa da senciência em invertebrados não é nova. Filósofos e ativistas há muito defendem a consideração moral dos invertebrados com base na sua capacidade de terem experiências subjetivas. A Declaração de Cambridge sobre a Consciência de 2012 reconheceu a probabilidade de consciência em muitos animais não humanos. A Declaração de Nova York é ainda mais conservadora do que a Declaração de Cambridge no que diz respeito à consciência em vertebrados como peixes e répteis e em cefalópodes. A Declaração de Cambridge inclui o seguinte (infelizmente, em uma nota de rodapé): “é indiscutível que todos os vertebrados, incluindo peixes e répteis, possuem os substratos neurológicos da consciência, e há adicionalmente evidências muito fortes para apoiar que os invertebrados, incluindo (mas não se limitando a) crustáceos decápodes, moluscos cefalópodes e insetos também as possuem”.
O que há de novo na Declaração de Nova York é o crescente reconhecimento dessa possibilidade e das suas implicações éticas.
O que você pode fazer? Apoiar futuras pesquisas sobre senciência em invertebrados que não os prejudiquem. Evite produtos provenientes da exploração sobre invertebrados. Defenda políticas que levem em consideração o bem-estar dos invertebrados. E divulgue a Declaração de Nova York sobre a Consciência Animal e as evidências sobre a consciência em uma vasta gama de animais.
Converse mais sobre este assunto com Senti, nosso assistente de IA.